Confira detalhes da Roda de Conversa em homenagem ao Dia da Mulher

Coletivos feministas defendem atuação conjunta contra o machismo

Por Lara Rosado - atualizado em 23/07/2019 as 13:37

Unindo forças. É dessa forma que feministas acreditam que o mundo pode ser um lugar melhor para as mulheres que lutam diariamente contra o assédio e diferentes tipos de violência. O assunto foi tema da Roda de Conversa promovida ontem pela Rede Gazeta, em parceria com a Casa do Saber Ri, em homenagem ao Dia Internacional da Mulher. Os coletivos Think Olga, Não é Não! e Das Pretas marcaram presença no debate.

Entre as participantes do evento estava a atriz, ativista e embaixadora da paz, Maria Paula. Segundo ela, o momento histórico atual é propício para que as mulheres sejam protagonistas. “Muitas mulheres lutaram para estarmos aqui. Agora chegou a nossa vez. O machismo eu já julgo como algo que está no passado.”

Já a jornalista Juliana de Faria, do coletivo Think Olga, compartilhou o primeiro assédio que sofreu na vida, quando tinha apenas 11 anos. “Dois homens me assediaram na rua e eu comecei a chorar. Uma vizinha me viu e perguntou o que tinha acontecido. Eu contei tudo e ela me respondeu ‘deixa de besteira, você vai sentir falta desse tipo de atenção quando for mais velha’”. A militante contou que, naquela época, se calou porque entendeu que seu próprio corpo era público.

Anos depois, cansada de ver cenas de assédio sendo repetidas e até mesmo classificadas como “manifestações naturais de masculinidade”, Juliana decidiu dar um basta: “Percebi que estava na hora de eu mesma falar sobre o assédio. Surgiu então nossa campanha ‘Chega de fiu-fiu’ porque nós, mulheres, não vivenciamos os espaços públicos da mesma forma que os homens. Nós somos podadas.”

Fundadora do movimento Não é Não! que ganhou as ruas do carnaval em diferentes cidades do Brasil por meio das tatuagens temporárias, a estilista Aisha Jacob contou que o coletivo também dá palestras em escolas do Rio de Janeiro para falar sobre o feminismo. “Esse ano foi o primeiro carnaval que teve a lei do não. Finalmente entenderam o que estamos falando. A mensagem que eu deixo para as mulheres é: denunciem e façam boletins de ocorrência. Precisamos dos dados para mudar nossa realidade.”

Os alimentos arrecadados na entrada do evento foram doados ao Movimento de Mulheres de Cariacica, que desempenha um trabalho de suporte na cidade.

“Somos um grupo de mulheres que doam seu tempo e seus ofícios para ajudar no atendimento daquelas que foram vítimas de violência. Damos até suporte jurídico. Temos nossa página no Facebook onde recebemos a maior parte das denúncias e damos o encaminhamento necessário”, ressaltou a idealizadora da iniciativa, Vilmara Claudino.

Para a diretora de Transformação da Rede Gazeta, Letícia Lindenberg, a discussão sobre os direitos da mulher é fundamental para a construção de uma sociedade mais justa. “O repúdio à violência contra a mulher é um compromisso da Rede Gazeta com esta e com as próximas gerações. Acreditamos e colocamos nossos veículos de comunicação como porta-vozes desta causa que não tem gênero, cor nem classe social.”

Ativista alerta: “A sentença é preta e o direito é branco”

Em uma sociedade machista e patriarcal, ser mulher já é difícil. Mas ser mulher e negra é ainda mais desafiador. A presidente da organização capixaba Das Pretas, Priscila Gama, é enfática: “As mulheres negras são invisíveis, suas dores são invisíveis. As negras falam sobre suas vidas e não são vistas, mas as brancas que falam das negras são ouvidas.”

De acordo com Priscila, o Das Pretas surgiu diante de dados alarmantes de negras assassinadas apenas por serem do sexo feminino em Vitória. “Os índices no geral até diminuíram, mas a diferença entre o feminicídio preto é de 71%. Ainda há casos de mulheres negras que não se reconhecem como negras. Dessa forma, o número pode ser ainda maior”, comentou.

Há cinco anos no cenário capixaba, o Das Pretas precisou criar uma metodologia de autofinanciamento porque nenhuma empresa privada se tornou parceira institucional do grupo até o momento. “Estamos falando de um espaço que a sentença é preta e o direito é branco”, destacou Priscila. Ao todo, as ações do movimento já atingiram cerca de duas mil mulheres.

Para lidar com a realidade de preconceito contra a mulher e com o racismo, Priscila disse que o instituto usa o termo “ubuntu” que, segundo ela, significa “nós por nós”. “Essa expressão não fala de você por mim, nem de eu por você. É como a história da sororidade. Significa respeitar o outro e as escolhas do outro. Por um tempo a gente passou a respeitar só quem pensa como nós. Avançamos muito nesse sentido.”

Violência

Priscila compartilhou que teve o corpo assediado a vida inteira. “Sou filha de um homem preto com uma mulher branca. Dizem que eu sou morena, me colocam nesse lugar para me fazer entender que eu não sou tão preta assim”, comentou, acrescentando que hoje, aos 37 anos, se sente digna e plena.

Além dos assédios praticados pelos homens, Priscila alertou ainda que mulheres brancas também assediam as negras. “Elas nos tocam. Isso nos agride, nos fere. Nosso corpo precisa ser respeitado.”

Depois de levantar a discussão sobre os desafios da mulher negra, Priscila faz um único pedido: “Nos enxerguem. Compartilhem a luta conosco. O feminismo não é só de vocês.”

Mulheres da área rural terão atendimento especializado

A Secretaria Estadual de Direitos Humanos vai dar início, neste mês, a uma série de atendimentos focados em mulheres que vivem em áreas rurais, quilombolas e em áreas de risco – além das que se inserem na comunidade LGBT. A proposta é, de acordo com a secretaria da pasta, Nara Borgo, levar atendimento especializado.

“Nós já vivemos muitos anos na invisibilidade, principalmente, esses grupos, que nem nos livros de história aparecem. Dessa forma, o objetivo é levar informação para que todas as mulheres saiam mais estimuladas e cientes dos seus direitos”, explica Nara.

Além disso, 5 municípios do interior (Pancas, Laranja da Terra, Guarapari, Anchieta e Aracruz) irão receber a Unidade Móvel de Atendimento à Mulher com atendimentos de psicólogos, defensores públicos, assistentes sociais e profissionais da área de saúde. Assim como, terão orientação e assistência sobre o combate à violência.

Orientação

“Delegacia não é um local só para penalizar, mas também é um porto seguro para as mulheres que precisam de orientação”. Essa é fala da delegada Ana Carolina Marques, que está a frente da Delegacia de Atendimento á Mulher, em Viana, onde tramitam, por mês, uma média de 20 a 25 inquéritos. Segundo ela, em 90% dos casos as mulheres relutam em terminar o relacionamento e precisam de orientação sobre como proceder diante de ameaças.

“Precisamos respeitar o direito da mulher de querer ficar junto com seu parceiro. Porém, vejo a importância de atender essas mulheres, olho no olho, para informar a necessidade de denunciar qualquer tipo de ameaça ou violência”, frisou a delegada.

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